A Casa Lilás


Lurdes entrou na sala da casa de minha avó esbaforida, aos gritos: Dona Amelinha,  mataram doutor Carlos! Era cedo na manhã do dia 29 de abril de 1958. Casa, na rua Itabaiana 707, já estava acordando. Eu , com onze anos, me arrumava para ir ajudar à Missa na Capela de Nossa Senhora Menina. A princípio, minha avó e minha mãe entenderam que a vítima teria sido o doutor Carlos Melo, muito amigo e  compadre da família. Depois que minha mãe conseguiu acalmar a funcionária, entendemos que o assassinado era o doutor Carlos Firpo que morava na rua de Campos e habitualmente em nossa porta, quase sempre de carro, com sua esposa, dona Milena.

Pela tarde,  toda a vizinhança foi para a rua assistir a passagem do cortejo fúnebre. Ninguém ficou indiferente ao homicídio. Os boatos começaram. Aracaju, tão bem descrita pelo autor na sua pequenez física, ficou dividida. A cada momento surgia uma nova versão do crime.

A leitura de A CASA LILÁS me levou a um passado que me assustou. Lembrei-me com toda clareza de Aracaju dos anos 50 e 60. Das sua gente, cuja grande maioria já não existe mais. Pessoas frustradas, vivendo em uma cidade sem perspectiva. Vida miúda. Sórdida. Era o pano de fundo do crime da rua de Campos que tirou a vida de um médico jovem e destruiu a vida de algumas famílias.

Na minha mocidade convivi com Umberto Mandarino que tinha por mim uma amizade paternal. Foi peça importante no meu julgamento na Auditoria da Sexta Região Militar, no ano de 1971, em razão de suas ligações com Lomanto Júnior, ex-governador da Bahia e muito influente na Auditoria Militar, através do procurador Andrade, que tinha sido o primeiro delegado de polícia de Salvador quando do seu governo. Nas conversas com Umberto, que frequentava minha casa na rua Duque de Caxias 120, ele me contava do empobrecimento da família. Dizia ele que “você não sabe o que foi sustentar a justiça de Sergipe no processo de Milena, minha irmã.” 

A CASA LILÁS conta, sem paixão, uma história nunca terminada. O assassino de Carlos Firpo, Euclides Timóteo, tinha que morrer. Sabia demais. Conta também de atitudes decentes, como a posição das irmãs Galrão Leite, do Colégio do Salvador, em solidariedade à viúva de Carlos Firpo, Milena Mandarino. Da grandeza de Antônio Garcia Filho , médico, com sua música Injustiçada, tão tocada em Aracaju, na voz de Alcides Gerardi. 

Outros saem menores com Seixas Dórea. Deputado federal da UDN, participando do grupo progressista que se intitulava de Bossa Nova, com posições nacionalista. Fraquejou, não denunciou a truculência policial que assassinou um preso. Para isso era preciso arriscar a  sua reeleição de deputado federal. Optou pelo silêncio. Lamentável.

Uma história sórdida. Um grande livro, baseado em uma pesquisa impressionante.

Por: João Augusto Gama.

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