Um protesto silencioso, porém contundente, toma conta das
redes sociais de Sergipe. Músicos que se apresentaram no Carnaval de Canindé de
São Francisco, município administrado pelo prefeito Machado Barbosa (União
Brasil), denunciam a falta de pagamento dos cachês prometidos. A insatisfação,
exposta em grupos de WhatsApp e replicada em plataformas públicas, expõe uma
contradição incômoda: enquanto a gestão municipal ostenta receitas milionárias,
artistas locais permanecem sem receber pelo trabalho prestado há mais de dois
meses.
A situação é, no mínimo, paradoxal. Em declarações recentes,
o prefeito Machado Barbosa exibiu sorriso orgulho ao afirmar que o município
arrecada R$ 20 milhões mensais, valor suficiente para custear eventos e
investimentos. No entanto, a realidade dos artistas contrasta com a narrativa
oficial. Enquanto verbas são alocadas para viagens e outras despesas, o
compromisso com a cultura local parece negligenciado. A pergunta que se impõe é
inevitável: por que um evento tão relevante para a economia e a identidade
cultural da região foi relegado a segundo plano na agenda de pagamentos?
A exposição pública do caso nas redes sociais não é mero
acaso. Trata-se de uma estratégia de sobrevivência para artistas que dependem
desses pagamentos para subsistir. A escolha de mencionar famílias (“também têm
família”) não é retórica vazia: muitos músicos integram grupos artísticos
regionais que sustentam lares com a renda de apresentações. O silêncio da
prefeitura diante das cobranças – que já ultrapassam 60 dias – alimenta
suspeitas de má gestão ou prioridades distorcidas.
Não é a primeira vez que a gestão de Machado Barbosa
enfrenta questionamentos sobre transparência financeira. O histórico levanta
dúvidas: haveria um padrão de desrespeito a compromissos com artistas locais? A
falta de respostas formais às cobranças atualiza fantasmas do passado e mina a
credibilidade da administração.
O Carnaval, tradicionalmente um termômetro do investimento
cultural, reflete aqui uma triste realidade. Se, por um lado, o evento
movimenta hotéis, comércio e gera visibilidade, por outro, revela uma cadeia de
exploração velada: artistas são tratados como parceiros descartáveis, enquanto
o poder público se beneficia de sua mão de obra sem honrar acordos. A postura
do prefeito – que sorri ao anunciar cifras milionárias, mas se omite diante de
dívidas trabalhistas – evidencia uma desconexão perigosa entre discurso e
prática.
O Artigo 5º da Constituição Federal é claro: “ninguém será
privado de direitos por motivo de crença, ofício ou profissão”. O não pagamento
de serviços prestados configura violação trabalhista, passível de ação
judicial. A omissão da prefeitura não só fere a dignidade dos músicos, mas
também abre precedentes para questionamentos legais. Enquanto isso, a pergunta
ecoa nas redes e nas ruas de Canindé: se o dinheiro não falta para viagens e
eventos políticos, por que falta para quem produz a cultura que enobrece a
cidade?
*O uso de expressões informais como “fumo!” (provavelmente uma corruptela de “nada até agora!”) e abreviações como “tbm” foi mantido nas citações para preservar a autenticidade das mensagens, mas neutralizado no corpo do texto por questões de normatização jornalística*
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