"O vovô te perdoa", diz homem que pulou quatro andares para se salvar de incêndio atribuído a neta de 11 anos


O idoso que se jogou do quarto andar de um prédio em chamas, junto com sua esposa, após a própria neta, de 11 anos, ter tido um surto e colocado fogo no apartamento, afirma que perdoa a menina. O caso ocorreu na tarde do último sábado (14), em um condomínio no Bairro Ipanema II, em Patos de Minas, Minas Gerais.

"Sou como um pai para ela. Ela é meu xodó", diz o avô. O nome dele foi preservado na reportagem para não identificar a criança. O idoso de 70 anos, e a mulher de 52 tiveram que pular cerca de 12 metros de altura para escapar das chamas que começaram enquanto o casal dormia e que destruíram completamente o imóvel no condomínio Morada das Palmeiras.

Ele saiu sem um arranhão, mas a esposa está internada para uma cirurgia nas pernas porque, ao saltar, quebrou dois dedos de um pé e o tornozelo. "Arrisquei porque se ficasse morreríamos queimados", disse o idoso afirmando que eles terem escapado com vida era um milagre.

Ele contou que, junto da mulher, cria a neta para ajudar a filha, separada do pai da criança, e que trabalha fora. De acordo com o avô da menina, sua neta, que tem diagnóstico de bipolaridade, começou a apresentar sinais de um comportamento que a família considerava fora do normal desde muito cedo. 

"Com um ano e meio, ela pegou cocô e saiu espalhando na própria roupa, na televisão, na cama. Isso não era normal. Depois, aos seis, sete anos, fugiu de casa e só foi encontrada na casa do padrinho cinco bairros daqui de casa. Ela oscila, às vezes tá muito calada, outras horas muito falante, às vezes triste, outras muitas alegres. Ela toma medicação para controlar (os sintomas) desde muito pequena, mas não tem cura, infelizmente", contou o avô.

Desde que tudo aconteceu, ele falou pouco com a neta. Sem ter onde morar, foi para a casa da filha, que se desdobra em cuidados com a mãe, que está internada no Hospital Regional Antônio Dias. O avô diz que ele próprio não pode afirmar com certeza que foi a neta a responsável pelo incêndio que começou pelo sofá da sala.

"Eu não vi, estava dormindo. Na internet, tem 36 milhões de pessoas massacrando minha neta, e ninguém para ajudar", desabafou o idoso, pontuando que qualquer pessoa que responsabilize a criança está sendo precipitada porque também não presenciou a situação. 


CASTIGO

O idoso disse que ele e a esposa se assustaram ao descobrir que a criança usava o celular para pesquisar sobre bruxaria e trocar mensagens com um amigo sobre o tema. A avó deixava que a menina usasse o celular, desde que ela tivesse a senha, e foi assim que descobriu o acesso dela a conteúdo inadequados para a idade e a proibiram de usar o aparelho.

Nos primeiros dias da proibição de usar o celular, a criança parecia inconformada, mas, de acordo com o avô, foi se acalmando e aceitando a situação. Mas, após voltarem de uma viagem de quatro dias em Porto de Galinhas, em Pernambuco, ocorreu o incidente.

“Chegamos [da viagem] às cinco horas da manhã. Eu estava cansado, não tinha dormido nada. Mas, como de hábito, eu fui estudar a palavra na Bíblia, como faço todo sábado de manhã. Depois, por volta das três da tarde, depois de almoçar, fui deitar-me. Minha mulher já estava dormindo. Cansado, eu peguei logo no sono. Uma hora depois, não vou saber precisar, acordei sentindo cheiro de fumaça entrando pelo quarto e algo estalando, barulho de fogo queimando material”, conta o idoso, afirmando que tentou abrir a porta na hora, mas ela estava trancada por fora.

Desesperado, o avô usou uma furadeira para tentar abrir a porta, mas o equipamento, ao ser forçado, entrou em curto-circuito. Depois, pegou um martelo numa bolsa de ferramentas que tinha dentro do quarto, mas também não conseguiu fazer buracos em volta da maçaneta para tentar abrir a porta. Abriu apenas um pequeno buraco, mas por ele o que entrou foi mais fumaça, tornando o ar irrespirável.

“Eu falei para a minha mulher, que estava muito nervosa com a netinha, não temos condição de ir lá fora. Ou nós pulamos ou morreremos asfixiados. É melhor a gente tentar pular. De qualquer maneira, vamos morrer. Minha nega, pelo menos, vamos morrer tentando”, contou o idoso.

Da janela, ele via vizinhos, moradores do bairro se amontoando em frente ao prédio. A janela do quarto tinha uma grade de proteção, que ele pôde cortar graças a um canivete que levava no bolso. Passado o susto, ele agradece em orações ao Espírito Santo e até os curiosos que pararam para olhar o que tinha tudo para acabar em tragédia.

“Toda a honra e glória pertence a Deus. Nessas horas, até o curioso ajuda porque ele dá coragem aos outros para agir. O Espírito Santo já tinha me falado: pula e confia. Eu gritei para um colega pegar um colchão e colocar no chão para amortecer a queda. Assim que ele trouxe, outros moradores, não sei quantos, pegaram mais colchões. Segurei minha mulher pelo braço e mirei bem para ela cair sobre eles porque se ela esbarrasse nos batentes dos andares debaixo ia morrer.


O QUE VAI OCORRER COM A NETA

De acordo com o avô, a menina está sob acompanhamento de psicólogos e se calou sobre o episódio, nem confirma ter feito, nem nega. O Conselho Tutelar de Patos de Minas está acompanhando o caso e a Polícia Civil investiga o incêndio.

O homem relatou que conversou com a neta muito rapidamente depois do ocorrido, mas que não quis se aprofundar no assunto para não aumentar o sofrimento dela. "Eu só disse que ela não tem culpa de nada, falei: 'o vovô te perdoa'".

O idoso contou que a sua neta toma remédio há muitos anos para controlar a bipolaridade e relatou o seu comportamento na escola. “Há problemas pontuais. Na escola, às vezes, ela fica agressiva e vai para a secretaria, mas eles já sabem do caso. Os professores a elogiam muito, dizem que ela é muito inteligente. De fato, é mesmo, gosta de artes, desenha muito bem”, afirmou o avô.

“Aquele trem [o celular] vai fuçando a mente da pessoa e leva a fazer esse tipo de coisa. A gente gostava que ela visse desenhos bíblicos, mas ela acabou entrando nesses sites de magia negra. Mesmo assim, não posso afirmar que ela fez [atear o fogo que desencadeou o incêndio] porque não vi. Eu, como avô, não acredito que ela tenha feito isso. Mas, se fez, está perdoada”, disse o avô que tem outro filho e mais três netos.

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