Recordações Inesquecíveis de uma bunda “sajada”

As coisas não eram fáceis na minha família. Em 1975, meus pais, Argemiro e Regina, precisavam trabalhar muito para sustentar os sete filhos e a bodega montada na frente da nossa casa na Rua Duque de Caxias em Paulo Afonso no Sertão da Bahia era o que supria as nossas necessidades. Só alguns anos depois minha mãe começou a vender roupas na feira da cidade.

Naquele ano eu estudava na Escola Casa da Criança 2 ligada à Igreja católica e que até hoje existe. Foi lá que eu comi um dos melhores cachorros-quentes em rodelas da minha vida. Eles eram vendidos por uma Senhora por cima do muro de mais ou menos um metro de altura.

Aquela Escola de cinco salas de aula foi onde eu fiz meu primário até a quarta série. Na frente dela tinha um espaço vazio que transformávamos em campo de futebol durante os intervalos de aulas. Esse espaço separava a escola do muro para onde íamos comprar lanches, se tivéssemos algum dinheiro dado pelos nossos pais.

Sentávamo-nos no muro de cimento batido sem nenhum beneficiamento. E esse foi o erro de muitos, inclusive o meu. Muitos tinham calças jeans e a marca predominante era a LEE. Isso para quem podia comprar. A minha era uma azul com um brilho arretado que eu nunca entendi porque minha mãe a comprou para mim. O tecido era mais frágil que os jeans. E por isso mesmo foi mais rápido rasgar após sentar, se mexer, brincar naquele muro enquanto comia o cachorro-quente.

O fundo da calça rasgava fácil. Para solucionar o problema, minha mãe “sajou” a calça com um pedaço de pano que tinha em casa. A linha usada se assemelhava a azul, mas nem de perto era da cor da calça e após várias vezes que eram colocadas, ficava mais feio ainda. Confesso que naquela época eu nem ligava para a situação que hoje lembrando acho por demais ridículo. Mas a situação não era uma primazia minha e muitos outros passavam pela mesma situação.

A situação chegou a um ponto que aquela bendita calça ficou de um ano para outro. O que hoje é moda no estilo “pescador”, nós conhecíamos também como “Mocorongo”. Mas não era visto como moda e sim por falta de recurso para a compra de outra novinha em folha. A pobreza é uma merda mesmo.

E foi com aquela calça sarjada na bunda que passei parte da minha infância estudando na Casa da Criança. E o que nunca me foi visto como vergonhoso, hoje sinto que bom mesmo era a nossa infância onde nada era pecado, proibido ou visto com desdém. E vamos vivendo das nossas memorias, daquilo que foi belo um dia em que a vida tinha um sentido lúdico.

Por Dimas Roque

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